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Conexão Haiti x Dália: um “voo” que iniciou há oito anos

Outubro é o mês de aniversário para todos os haitianos que encontraram na Cooperativa Dália Alimentos, em Encantado, espaço e abrigo para um recomeço.  Chegados em 2012, quando o primeiro grupo com cerca de 50 estrangeiros começaram a trabalhar na cooperativa, ou agora, quando semanalmente aqui chegam em busca de novas oportunidades.

Já se passaram oito anos desde que o primeiro grupo de 50 pessoas foi selecionado na cidade de Brasileia, no Acre, para começar a trabalhar na Dália. Na viagem e na pequena bagagem, o sonho de um trabalho digno e de um (re) começo de vida, já que a terra natal havia sido devastada pelo terremoto em 2010. Era a mão de obra que a cooperativa necessitava à época e a oportunidade que os imigrantes tanto almejavam.

Hoje o número de haitianos que são funcionários da Dália chega a 478 de um total de 2.747 empregados, o equivalente a 18% do quadro total. O número expressivo se deve à adaptação que eles tiveram em relação à empresa, ao município, à região e também à necessidade de trabalhar para garantir renda às suas famílias, muitas delas deixadas no Haiti. Vários exemplos de companheirismo, amizade e convívio são registrados diariamente dentro da empresa, seja nas indústrias frigoríficas, nas unidades de lácteos ou nas fábricas de rações.

E por falar em fábrica de rações, sete haitianos são mais que colegas de trabalho no setor de apoio de recebimento de grãos e farelo de soja da unidade localizada junto à sede da Dália, em Encantado. De um total de 11 funcionários do setor, sete são do Haiti. Todos carregam em suas histórias aspectos em comum, como a busca por dignidade no Brasil e, principalmente, por uma nova vida, pautada pelo trabalho, pelo desejo de juntar dinheiro e de um dia poder voltar à terra-mãe.

Deste grupo, o primeiro a chegar à Dália foi Guy Jeudy (37), em dezembro de 2015, por indicação de um primo que já estava trabalhando na empresa. Depois, em agosto de 2017, chegou Samuel Nicolas (32) seguido por Presnel Jean Baptiste (35), ambos em dezembro do mesmo ano. No início deste ano, mudaram-se para Encantado Valex Theobal (30) e Mousseau Zilerne (23). Kenson Sudre (29) e Marc Henry Joseph (24) chegaram no mês de maio.

Guy é o que melhor fala compreende fluentemente a língua portuguesa e ajuda os demais na tradução do idioma diante das dificuldades de comunicação. Até o encarregado, Leandro Daniel Roos (34), entrou no ritmo dos haitianos e aprendeu algumas palavras em “crioulo”, dialeto da língua francesa falada pelos haitianos. “Admiro e respeito muito o trabalho deles, pois exige força e resistência, principalmente no verão. Além de trabalhadores, são unidos e honestos. Embora a saudade dos familiares, deixaram tudo para trás em busca de novos sonhos aqui na Dália”.

Pontuais quanto ao horário de trabalho, se adaptaram à realidade de um país e de um povo totalmente diferente, contudo, não deixaram os costumes do Haiti de lado, como as refeições, as danças, a língua, a música e a religiosidade. Segundo Guy, o mais difícil para todos ainda é o idioma. “Hoje a gente se ajuda, somos todos amigos e gostamos de morar aqui. O trabalho é bom, somos tratados bem e isso nos deixa felizes. Quando um não entendo o português, eu ajudo e assim eles começam a aprender sozinhos, como eu”. Além dos 478 haitianos, 36 estrangeiros de outras nacionalidades também trabalham na cooperativa, oriundos da Argentina, do Paraguai, do Uruguai, da Venezuela, da República Dominicana e de Gana.

Saudade da família e do país

Uma palavra da língua portuguesa e muito falada pelos haitianos é saudade. Questionados do que mais sentem falta do Haiti, relatam em coro a família, em especial a mãe e o pai. O desejo de um dia retornar não foge de cogitação, tampouco a de trazer familiares para o Brasil. Mas devido aos altos custos, no momento a distância continua sendo um empecilho para estes estrangeiros sonhadores. Kenson é casado e pai de Kenline (10) e Kensley (1), os quais ficaram no Haiti com a esposa; assim como Presnel, que também é pai de Richard Jean (13), que permaneceu com a mãe na América Central. O único que conseguiu visitar o Haiti para rever a família foi Samuel, no ano passado, e programa o retorno para 2021.

De acordo com o supervisor das fábricas de rações, Walter Rahmeier, diariamente, uma média de 600 toneladas de milho e 200 toneladas de farelo de soja são descarregadas na cooperativa, trabalho este desenvolvido pelos sete haitianos, mais os funcionários Onei Luiz Andriolli (60), na Dália há 18 anos, Gismar Costaneski (51), funcionário há sete anos e Amarildo Scartezini (47), há dois anos na Dália.

Gratidão pelo trabalho

A supervisora do Setor Pessoal, Sandra Simonis Lucca, foi quem acompanhou toda a saga dos haitianos até chegada à cooperativa, inclusive, foi ao Acre para buscá-los. Ela lembra que se deparou com a situação de vulnerabilidade que se encontravam, passando por necessidades, fome e higiene. “O que oferecemos em 2012 foi a possibilidade de uma vida melhor e mais digna em uma região em que há emprego e possibilidades de concretizarem sonhos. Felizmente foi o que aconteceu. Muitos que chegam à Dália solicitando uma vaga de emprego buscam justamente por um recomeço”.

Quanto à mão de obra, classifica como a brasileira: comprometida e assídua. “Fizemos um grande esforço para trazê-los, enfrentamos dificuldades e quebramos paradigmas. Hoje a Dália é um território de trabalho, convício e amizade para centenas de haitianos que deixaram um país devastado e encontraram aqui o carinho que tanto necessitavam. Muitos já estão estabelecidos, com casa própria, automóvel, família, filhos e são felizes no Brasil, e, acima de tudo, trabalhando conosco. O maior orgulho é ver que nossa ideia deu certo e que hoje os haitianos que permaneceram conosco tem a felicidade estampada no olhar de quem passou a viver com dignidade”.

Criando raízes e família

Para o presidente Executivo da Dália Alimentos, Carlos Alberto de Figueiredo Freitas, a decisão de trazê-los ocorreu pela economia da época, muito ativa, e pela consequente falta de trabalhadores disponíveis na região. “À época, sabíamos que a contratação de mão de obra estrangeira seria um grande desafio, devido às diferenças culturais, que começava pelo idioma. Por isso, seguimos um protocolo com cuidados especiais, o qual permitiu um resultado positivo, tanto para a Dália quanto para os imigrantes. Esse protocolo incluiu um estudo sobre a história do Haiti, para entendermos seu povo, reconhecidamente altruísta e trabalhador e dotado de personalidade forte”.

Conforme Freitas, o Haiti foi o primeiro país da América Latina a abolir a escravatura e o segundo a declarar independência. “Nesse contexto foi possível concluir que não aceitariam tratamento benevolente e, por isso, a primeira orientação repassada aos gerentes e supervisores foi de que os imigrantes deveriam ser respeitados e tratados em igualdade de condições aos trabalhadores brasileiros, ou seja, não poderia haver qualquer diferenciação no tratamento enquanto empregados. Inicialmente foram hospedados em um hotel da cidade, onde, durante seis meses, permaneceram em condições dignas de vida”, recorda.

Nesse período, a Dália recebeu auxílio da Comissão de Direitos Humanos do Estado para a correta introdução dos imigrantes na região. “Depois, inovamos e criamos um novo tipo de contrato de locação com as imobiliárias, permitindo residência fixa a eles. Todas essas ações resultaram no reconhecimento da UNESCO, que concedeu à Dália o registro como Case de Sucesso em trabalho digno com seu quadro de funcionários”.

O presidente executivo olha para o passado com carinho. “Já se passaram oito anos e acreditamos que a situação dos trabalhadores haitianos, hoje, é bem diferente de quando chegaram ao Brasil, pois estão adaptados à realidade de vida brasileira, onde estão criando raízes e família. De fato, percebemos que estão felizes e vivendo como nós, pois a Dália, desde o início, concedeu o respeito que confere a todos os seus funcionários, pois todos são iguais e pertencem à família Dália Alimentos”.

Fonte: Assessoria de Imprensa Dália Alimentos